Mesmo sem uma solução para o impasse em torno do acordo do Mercosul com a União Europeia, a visita do presidente da França, Emmanuel Macron, ao Brasil foi um dos mais importantes passos dados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sua política externa. Deu continuidade e ampliou uma parceria estratégica iniciada pelo próprio Lula, em 2006, durante o governo do presidente Jaques Chirac.
Naquela ocasião, a França reconheceu o Brasil como um ator global e aspirante legítimo ao Conselho de Segurança da ONU. Estabeleceram-se iniciativas conjuntas para compartilhamento de recursos materiais, tecnológicos, humanos ou naturais, nas áreas militar, espacial, energética, econômica, educativa e transfronteiriça (entre a Guiana Francesa e o Amapá).
Brasil e França, segundo Lula, trabalharão juntos para promover, pelo debate democrático, uma visão compartilhada de mundo: “fundamentada na prioridade da produção sobre a finança improdutiva, da solidariedade sobre o egoísmo, da democracia sobre o totalitarismo, da sustentabilidade sobre a exploração predatória”. Durante a visita de Macron, Lula assinou 21 acordos de cooperação com a França, em áreas como meio ambiente, inteligência artificial, direitos humanos e igualdade de gênero.
Destacam-se a criação de um centro de pesquisas da biodiversidade amazônica e a cooperação jurídica entre os países em matérias penais. Há ainda a previsão de uma parceria entre o Parque Amazônico da Guiana, na Guiana Francesa, e o Parque Nacional das Montanhas de Tumucumaque, no Amapá e no Pará. Já havia uma grande parceria militar na construção da nova frota de submarinos da Marinha do Brasil, cuja terceira embarcação foi lançada durante a visita, o Tonelero, e que inclui um submarino com propulsão nuclear com armamento convencional. A tecnologia do reator é brasileira.
Como o programa de construção de submarinos (Prosub), o Centro Franco-Brasileiro de Biodiversidade Amazônica, na Universidade da Amazônia, é fruto de negociações iniciadas durante o governo de Nicolas Sarkozy, quando o ex-presidente francês visitou o Brasil. Agora, chegou a um novo patamar, ao assegurar que parte dos benefícios provenientes das pesquisas seja compartilhada com as comunidades da região amazônica.
Lula e Macron também assumiram um compromisso institucional para promover a integração entre o parque amazônico da Guiana Francesa e o parque Montanhas do Tumucumaque, a maior reserva de floresta tropical do mundo. Localizado no Amapá, com uma porção menor no Pará, o parque abrange uma área de 3,8 milhões de hectares. A unidade faz fronteira com as florestas da Guiana Francesa. Com o acordo, a intenção é transformar essas áreas em um corredor florestal, protegendo mais de 7 milhões de hectares.
Transição ecológica e energética, bioeconomia, agricultura, tecnologia digital, inteligência artificial, direitos humanos e igualdade de gênero fazem parte da agenda de cooperação e ajudam a superar os obstáculos que impedem a França de apoiar a assinatura do acordo entre a União Europeia e o Mercosul. A cooperação jurídica em matéria penal e o combate ao garimpo ilegal na fronteira, que é a maior da França com outro país, e a cooperação em relação a minerais estratégicos, materiais críticos e segurança energética também são de grande importância.
Mais de 1.150 subsidiárias de empresas francesas estão estabelecidas no Brasil, onde geram 520 mil empregos e 61 bilhões de euros em faturamento. A França é um dos principais investidores no Brasil, com 41,3 milhões de euros em 2022. Entretanto, as relações comerciais entre os dois países são assimétricas.
No ano passado, a França exportou 4,4 bilhões EUR para o Brasil, que ocupa o 27º lugar entre seus clientes. O Brasil exportou para a França 4 bilhões EUR, é o 34º lugar entre os fornecedores da França. O problema somente pode ser resolvido com o acordo entre a União Europeia e o Mercosul. A dificuldade é mais econômica do que política: os agricultores franceses temem a concorrência do agronegócio brasileiro e pressionam Macron.
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